"De tanto ver triunfar as nulidades; de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça. De tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha
de ser honesto".

(Rui Barbosa)


sábado, 18 de junho de 2011

FHC, 80 anos: "o Brasil mudou muito, e para melhor, mas ainda falta muito"

Helena Celestino, Luiz Antônio Novaes, Silvia Amorim e Silvia Fonseca, O Globo

"Arrependimento? Se for ficar na política, acho que poderia ter sido mais suave, teria me desgastado menos e conseguido mais".

A crítica de Fernando Henrique Cardoso ao seu jeito presidente de ser combina com o bom humor e a língua afiada que mantém até hoje ao chegar aos 80 anos de idade.

Completamente adaptado à vida da planície depois dos oito anos no Palácio do Planalto, o ex-presidente está de bem com a vida. É generoso ao falar de aliados e opositores -, mesmo se ainda se ressente de como foi tratado por Lula - mas não perde a oportunidade de rir dele mesmo e dos personagens do mundinho político brasileiro.

Distante do dia a dia partidário, criou uma rotina prazeirosa, povoada por viagens, livros, amigos e filhos. Mora sozinho num amplo apartamento em Higienópolis - o bairro paulistano que ajudou a tornar conhecido como reduto dos tucanos - e é com gosto que passa as manhãs em casa, escrevendo dois novos livros - um de reflexões sobre o mundo contemporâneo e outro revisitando a obra dos pioneiros do pensamento sociológico e político brasileiro, como Joaquim Nabuco, Gilberto Freire e Florestan Fernandes.

- Nunca consegui trabalhar fora de casa - conta, revelando o vício do intelectual que detesta escrever de terno e gravata. - Já escrevi de pijama e até de calção, mas no Alvorada não dava para pisar naqueles tapetes de pé molhado - brinca.

Nesses 80 anos de vida, em que momentos ou em que papéis o senhor se sentiu mais confortável?

Para ser franco, eu me sinto à vontade em muito papéis. Eu não desgostei do exercício da Presidência. Nunca me queixei de doença, cansaço, embora às vezes estivesse cansado. Eu não achava mau, assim como me adaptei imediatamente a outro estilo de vida (ao deixar a Presidência). Fui dar aula de novo. Aula é um modo de dizer porque em Brown (University), onde eu era professor-at-large, mas recebia alunos, dava seminários. Eu me adaptei. Depois, passei a ter funções em organizações internacionais, fui presidente do Clube de Madrid. Hoje participo do grupo do (Nelson) Mandela, que é muito ativo, negociações pelo mundo afora, uma porção de coisas. E participo de vários conselhos e fundações...

Mas no Palácio era possível conciliar os papéis de presidente e intelectual?

Com dificuldade. Nunca deixei de ter um certo olhar distante, que é o do intelectual, o que é uma desvantagem na vida política.

Por que é desvantagem?

Porque você se refreia, tem um olhar crítico, então não faz uma porção de coisas que os políticos têm que fazer. Você tem mais autocrítica, mais freios. Mas isso tem uma vantagem, que me ajudou muito, que foi não entrar no olho do furacão. Quando, por exemplo, atacam muito pela imprensa, ou a própria imprensa ou os políticos, percebo que estão atacando um personagem, não eu como pessoa. Sei me distanciar.

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